O pintor e ceramista Manuel Cargaleiro morreu este domingo, 30 de junho, aos 97 anos. O Governo vai decretar um dia de luto nacional para o dia das cerimónias fúnebres do artista plástico, anunciou o primeiro-ministro, Luís Montenegro, conforme a Lusa. A Câmara Municipal de Castelo Branco decretou três dias de luto com a bandeira do Município colocada a meia haste, a partir de amanhã, segunda-feira, 01 de julho.
Natural de Chão das Servas, no concelho de Vila Velha de Ródão, Manuel Alves Cargaleiro nasceu a 16 de março de 1927 e tornou-se um dos mais conceituados artistas plásticos portugueses no mundo. Vivia em Paris desde 1957.
Iniciou-se na modelação de barro aos 18 anos, na olaria de José Trindade, no Monte da Caparica. Manuel Cargaleiro frequentou a Escola Superior de Belas Artes no início da carreira nas Artes Plásticas. Aos 22 anos, participou na “Primeira Exposição Anual de Cerâmica”, em Lisboa, inaugurando o percurso de exposições por todo o mundo, conforme a biografia.
Manuel Cargaleiro participou em mostras na Alemanha, Angola, Bélgica, Brasil, Espanha, França, Moçambique, Itália, Japão, Suíça e Venezuela, de forma individual ou coletivamente.
Entre as obras do artista, destaca-se o painel de cerâmica das estações da Via Sacra do Santuário de Nossa Senhora de Fátima; os painéis de cerâmica para o Jardim Municipal de Almada; o painel de azulejos para a fachada da nova Igreja de Santo António, em Moscavide; uma medalha da autoria do escultor Lagoa Henriques para comemoração do 25.º aniversário da atividade artística de Manuel Cargaleiro; e os painéis de azulejos de diversos locais públicos em Portugal, e da estação de metro “Champs-Élysées – Clemenceau”, em Paris.
Nota de pesar do Presidente de República
O anúncio foi feito pelo Presidente da República, numa nota de pesar “pela morte de Mestre Cargaleiro, que hoje nos deixou”, na manhã de domingo.
A despedida do “ceramista e pintor, mas também desenhador, gravador e escultor, Mestre Cargaleiro” foi marcada pela memória “das imagens e das cores da Beira Baixa”, conforme evocou o Presidente da República.
Apesar de viver há muitos anos fora de Portugal, Manuel Cargaleiro foi recordado por Marcelo Rebelo de Sousa por nunca ter deixado que “o cosmopolitismo significasse desenraizamento”.
A mensagem de Marcelo Rebelo de Sousa na íntegra
“O Presidente da República manifesta o meu pesar pela morte de Mestre Cargaleiro, que hoje nos deixou. Tendo vivido em Paris desde 1957, Manuel Cargaleiro nunca deixou que o cosmopolitismo significasse desenraizamento. Prova disso é a memória das imagens e das cores da Beira Baixa na sua obra, nomeadamente a lembrança das mantas de retalhos; prova disso igualmente a empenhada presença do artista na região onde nasceu, através da Fundação e do Museu Cargaleiro.
Ceramista e pintor, mas também desenhador, gravador e escultor, Mestre Cargaleiro deixou a sua assinatura em igrejas, jardins ou estações de metro, e em inúmeras peças tão geométricas e cromáticas como as de outros artistas cosmopolitas que viveram em Portugal. Por isso, tendo estado fora décadas, continuou a sentir-se, e continuámos a senti-lo, um artista português.
De Cargaleiro disse Maria Helena Vieira da Silva que possuía a técnica perfeita, a medida certa, as cores raras; e disse Álvaro Siza Vieira que evidenciava uma alegria invulgar no panorama artístico português. Tendo-o condecorado, em 2017, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique e, em 2023, com a Grã-Cruz da Ordem de Camões, o Presidente da República teve a oportunidade de homenagear essas singularidades em breve mensagem para o catálogo da última exposição que fez, texto no qual saudou, e renova agora a saudação, a sua obra jubilosa e luminosa, fiel ao passado e ao presente, a um tempo que é o nosso e que também foi o seu.
O Presidente da República nunca esquecerá o último encontro com Mestre Cargaleiro, semanas atrás, na casa deste em Lisboa, em que continuava a sonhar projetos para o futuro e a acreditar na Vida, sempre prestigiando Portugal.”
“Muita coisa será irrelevante […] Não uma obra do Manuel Cargaleiro”
Mais de dez mil obras constituem o legado do artista beirão patente no coração da zona histórica de Castelo Branco. A Coleção da Fundação Manuel Cargaleiro preserva um significativo património, com grande valor artístico, histórico e cultural no edifício histórico “Solar dos Cavaleiros”, um palacete do século XVIII e um edifício contemporâneo do século XXI no centro histórico albicastrense.
O presidente da Câmara de Castelo Branco lamentou a morte do pintor e ceramista Manuel Cargaleiro. Leopoldo Rodrigues referiu à agência Lusa que “o mestre Cargaleiro é uma figura maior da cultura nacional e da cultura albicastrense”. O autarca enfatizou a preocupação em homenagear a memória do artista plástico devido ao facto da fundação e do museu estarem em Castelo Branco.
Na biografia publicada na página quatro do semanário Expresso de 1997, Manuel Cargaleiro é descrito como “a pessoa mais incapaz de maldade que conheço” por Álvaro Siza Vieira. Como que a antecipar o futuro, o arquiteto Álvaro Siza Vieira disse estar convicto de que “daqui a muitos anos, quando já não o pudermos anotar, muita coisa hoje celebrada estará irrelevante ou materialmente destruída pelo tempo. Não uma obra do Manuel Cargaleiro”.
O Presidente da República condecorou o artista beirão com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, em 2017, e com a Grã-Cruz da Ordem de Camões, em 2023. Em uma breve mensagem no catálogo da última exposição de Cargaleiro, Marcelo Rebelo de Sousa saudou”a sua obra jubilosa e luminosa, fiel ao passado e ao presente, a um tempo que é o nosso e que também foi o seu”.
Manuel Cargaleiro foi o primeiro ligado às Artes Plásticas a ser atribuído o Doutoramento Honoris Causa pela Universidade da Beira Interior (UBI). Segundo a instituição, a honraria “representou o reconhecimento da UBI a uma personalidade da Beira Baixa, que alcançou projeção internacional pelo talento demonstrado como ceramista e pintor”.
O Politécnico de Castelo Branco (IPCB), a UBI e a Câmara Municipal de Castelo Branco manifestaram “profundo pesar” pelo falecimento de Manuel Cargaleiro.
O Município de Castelo Branco chamou a si “o compromisso de continuar a ser a casa expositiva [de Manuel Cargaleiro], perpetuando a relevância da sua obra e vida”, em nota no Facebook.