É você que anda a pedir uma ditadura?

Tendo-se ainda há pouco comemorado os 50 anos do 25 de abril 1974, a revolução que acabou com o regime autoritário do Estado Novo e reestabeleceu as liberdades democráticas que já não existiam no país desde o golpe militar de 1926, poderá fazer sentido falar da democracia, um regime em que através do sufrágio universal, todos participam no exercício dos direitos políticos.

Com a liberdade de opinião e expressão condicionadas no antigo regime, alguns precisando de operacionalizar a resistência antifascista, outros por serem perseguidos, tiveram de passar à clandestinidade e assim viveram e sofreram durante largos períodos da sua vida.

Encontrando esta realidade histórica suporte na falta de liberdades e na dura repressão exercida pelo Estado Novo sobre todos os que procuravam uma mudança de regime, uns democratas, outras muito pouco, sucede que a muitas organizações, passados 50 anos do 25 de abril, ainda lhes custa viver em democracia, sobretudo respeitar a vontade soberana do Povo e as maiorias emergentes das eleições, onde todos os partidos tiveram oportunidade de apresentar os seus programas eleitorais e de os submeter ao sufrágio.

O golpe militar conduzido pelo Movimento das Forças Armadas (MFA) abriu caminho para a resolução do problema da guerra colonial, para o desenvolvimento do país e para a democratização, mas há muita gente, de um lado e de outro da barricada, que ainda não aprendeu o que deve significar a democracia, pelo menos como eu a entendo, respeitando.

Alguns gostavam de voltar a viver num estado autocrático e securitário, fechado para o Mundo e para o fenómeno das migrações, outros idolatram as ditaduras de esquerda, da China à Rússia, de Cuba ou da Venezuela, há quem não queira saber mas também quem gosta só de falar da tirania da maioria, na maior parte dos casos e quando se trata de partidos políticos, porque sentem que eles dificilmente conseguirão receber essa confiança dos eleitores.

Deve ser por isso, quem sabe, que alguns, por muito grande que seja a derrota eleitoral, continuam a reivindicar o cumprimento dos seus programas eleitorais, desconsiderando à força toda o voto popular, mas continuando a afirmar-se democratas.

Não há falta de respeito pelas regras democráticas boa e falta de respeito má, consoante os fins com que se pretende justificar os meios, também não sendo verdade que as grandes mudanças sociais tenham de ser feitas à força ou que a serenidade seja sinónimo de falta de vontade e coragem, como muito bem demonstraram estes 50 anos de democracia.

Também não há populismo bom de esquerda e mau de direita, ou vice-versa, pois todo visa enganar ou influenciar, prometendo coisas que o país ou os governos não estão em condições de dar ou que nos custariam o sacrifício dos nossos direitos fundamentais, de cidadania ou da pessoa humana.
Ser sério e mudar as coisas que os cidadãos anseiam dentro do sistema, isso sim, é preservar a liberdade e os valores democráticos.

Habituados a ver as notícias cheias de comentários, de promessas impossíveis de cumprir, de demagogia e de todo o tipo de interpretações das entrelinhas dos discursos políticos, nem sempre valorizamos o trabalho metódico, sério e dedicado de alguns, as opções e a reflexão sobre os problemas do país que eles nos trazem, e devíamos, pois é no vazio que germinam os extremismos, o desinteresse e outros riscos que ameaçam ainda hoje o nosso sistema democrático, por muito que ele às vezes se mostre cristalizado e pouco mobilizador.

Faz-nos falta promover a ação cívica, o ativismo e a renovação na política sem recorrer à radicalidade, e, para isso, precisamos de políticos sérios, que só conseguiremos se também nós formos sérios nas escolhas que fazemos.

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